A HORA TERRÍVEL DO DIA
por Bill Mollison, 1981
Eu não acho que ninguém tenha sumarizado o que está havendo sobre a face da Terra.
Para podermos mudar nosso modo de vida, parece que precisamos aterrorizar-nos, prevendo
maremotos e catástrofes. Então a onda passa, e o foco das preocupações pode mudar. Mas o que está
acontecendo é algo pelo quel nós, como seres humanos, somos pessoalmente responsáveis. É algo bem geral;
quase tudo que dissermos aplica-se em todo lugar.
Os sistemas reais que estão começando a falhar são os solos, florestas, a atmosfera, e os ciclos de
nutrientes. E somos nós os responsáveis por isso. Não temos desenvolvido, em nenhum lugar do mundo
ocidental (e duvido muito que em qualquer outro lugar, a não ser áreas tribais) nenhum sistema sustentável de
agricultura ou manejo de florestas. Nós não temos um sistema. Vamos ver o que está acontecendo.
Florestas
Descobriu-se que as florestas são de fato muito mais importantes para o ciclo do oxigênio do que
antes se imaginava. Nós costumávamos pensar que os oceanos é que eram o elemento mais importante. Mas
não; não apenas eles não são muito importantes, contribuindo provavelmente com menos de 8% da
reciclagem do oxigênio atmosférico, como ainda muitos estão se tornando na verdade consumidores de
oxigênio. Se continuarmos despejando mercúrio nos mares, o oceano se tornará um consumidor de oxigênio.
O equilíbrio está mudando. E é portanto principalmente das florestas que dependemos para proteger-nos de
uma condição anárquica.
Sobre as florestas, algumas têm importância crítica, como as florestas permanentemente verdes, das
quais existem dois sistemas extensos: um é o equatorial, com grande biodiversidade, e outro as florestas da
tundra na Rússia e as florestas sub-temperadas do sul. Florestas úmidas tropicais são extremamente
importantes para o ciclo do oxigênio e estabilidade da atmosfera.
As florestas também propiciam uma boa parte da nossa precipitação chuvosa. Quando cortamos
florestas de serras e cadeias montanhosas, pode-se observar uma queda de 10 a 30% nas chuvas, o que alguém
poderia considerar tolerável. Porém, o que você não percebe é que a precipitação total pode cair até mais de
86%, sendo que a chuva em si representa apenas uma parte da precipitação total. Em sistemas florestais, é
bem possível ter substancial precipitação (orvalho) em uma noite clara, sem nuvens e nem um sinal de chuva,
especialmente em climas marítimos, mas também em outros climas. Portanto, é possível produzir condições
semi-desérticas muito rapidamente, simplesmente por cortar as árvores do topo de uma serra. E isso tem sido
feito em larga escala.
É o papel das florestas o de moderar tudo. Florestas moderam calor e frio excessivo, e também a
poluição excessiva. E é claro, são as florestas que criam solos. Florestas são um dos poucos sistemas capazes
de criar solos.
O que está havendo com as florestas? Nós usamos muito das florestas de uma forma banal: para
produzir papel, particularmente para jornal. A demanda tornou-se excessiva. No presente, cortam-se um
milhão de hectares a mais do que se planta. Mas isso pode mudar em qualquer mês: no mês passado, por
exemplo, a quantidade de árvores cortadas foi o dobro do normal, devido ao desmatamento do baixo
Mississipi para introdução de campos de soja.
De toda a cobertura de florestas que já houve, não resta mais que 2% na Europa. Eu não creio que
haja uma árvore na Europa que não esteja lá somente por causa da tolerância do homem, ou que não tenha
sido plantada por alguém. Não há florestas nativas na Europa. E só restam cerca de 8% de matas nativas na
América do Sul, e em todo lugar onde multinacionais possam obter possessão de áreas florestais.
Temos sido iludidos há muito tempo, com estórias que as companhias madeireiras plantam oito
árvores para cada uma que cortam. O que interessa na verdade é a biomassa. Quando você tira 150 toneladas
de alguma coisa de uma floresta e põe de volta não mais que 300 gramas, você certamente não está
preservando a biomassa.
E quais são os usos que damos para as florestas? Principalmente, usamos para fazer jornal e
embalagens. Até mesmo as poucas florestas primárias que temos estão sendo cortadas para isso, florestas que
até há pouco nunca haviam sido tocadas pelo homem. Árvores cujo primeiro galho só sai a 60 metros de
altura, catedrais gigantescas, sendo picadas pra fazer jornal e papelão. Ou seja, estamos degradando florestas
virgens pelo mais baixo uso possível.
Isso tem efeito em todos os outros sistemas. Dejetos provenientes das áreas desmatadas estão
matando largas áreas dos mares. O principal motivo por que os mares Báltico e Mediterrâneo, e a costa de
Nova Iorque se tornaram consumidores de oxigênio é que o fundo desses mares está coberto de dejetos das
florestas. Liberam-se aproximadamente 12 trilhões de toneladas de dióxido de carbono por ano, pela morte
das florestas. Nós dependemos das florestas para o controle do dióxido de carbono. Ao destruir as florestas,
estamos destruindo o sistema que poderia estar nos ajudando. No entanto, o que estamos fazendo é destruir os
últimos recursos que nos restam.
“Agricltura é um sistema destrutivo”.
Quais são as estratégias pelas quais não precisamos da agricultura? A agricultura é um sistema
destrutivo. Bem, precisamos de muitos mais jardineiros e horticultures. Jardineiros e horticultores são o tipo
mais produtivo de agricultores, e sempre o foram. Quando você passa a uma grande fazenda, está
simplesmente aceitando uma produtividade menor, mas menos gente para repartir o lucro. E é por isso que é
economicamente “eficiente”. Quando se fala de eficiência nesses casos, está-se falando de dinheiro. Quando
você reduz o tamanho das propriedades, desde que não seja pra menos de 1000 m2, a produção agrícola
aumenta. Muitos dizem que dividir grandes fazendas em lotes de 2 hectares é anti-econômico. 2 hectares pode
ser, mas lotes de meio hectare são altamente produtivos.
Agora, jardineiros... Quantos jardineiros há nos Estados Unidos? Cinqüenta e três porcento das
casas agora tem jardim. Jardins de 60 m2 em média. Produzem cerca de 15 dólares por metro quadrado. Esses
jardins estão produzindo 18% de toda a comida dos Estados Unidos, a um valor quase equivalente à
agricultura total.
Agora, vejamos a Rússia. O lavrador, em 2000 a 4000 m2, produz cerca de 84% da comida. As
fazendas do governo, que ocupam a maior parte das terras dedicadas à agricultura, produzem o resto. Mas as
fazendas estatais não estão fazendo seu trabalho. Elas têm um déficit de 6%, que é mandado do Canadá e
Estados Unidos. A agricultura glamourosa, de larga escala, não é a que está produzindo a comida.
Agora, estamos apenas com 20 alimentos básicos. O dia da soja está provavelmente chegando.
Você pode fazer praticamente qualquer coisa com a soja.
Controle de sementes
Eu não acho que haja muitas companhias de sementes no mundo que não pertençam a um
consórcio de não mais que umas 10 companhias. Certamente é o que temos na Austrália. As sementes agora
estão sendo produzidas e vendidas por multinacionais. Você consegue comprar um milho que não seja híbrido
nos Estados Unidos? Aqui e ali você consegue, mas na Austrália, simplesmente não se pode. Mas nós temos
uma companhia, chamada “Self-Reliance Seed Company” (agora Phoenix seeds), em Stanley, na Tasmania.
Ou talvez tenhamos duas.
O próximo truque do consórcio das companhias de sementes era pra ser uma legislação de patentes
de sementes. Nesse ponto, várias pessoas começaram a ficar desconfiadas. Patentear materiais biológicos foi
uma jogada suspeita. Aí, o Concelho Mundial de Igrejas olhou para a situação e criou o “Seeds of the Earth”
(Sementes da Terra). O gato estava fora do saco. Então houve uma revolta geral nas camadas baixas, contra a
apropriação de um recurso básico. “Seed Savers Exchange” é só mais um desses movimentos.
Mas uma coisa que isso pode ter-nos ensinado é: você não pode escapar de sistemas. Se enfiar em
um hectare na Nova Inglaterra não vai te tirar do sistema, a não ser que você tenha uma operação de produção
de sementes e saiba muito bem o que está fazendo. A maioria não sabe. Se você está se treinando para ser um
bom jardineiro, há certas áreas que você simplesmente ainda não entrou, e produzir sementes é uma delas. Em
um vale na Tasmania, entre um grupo de hippies vivendo lá, você pode encontrar 50 doutores. A maioria
deles está em casa, tricotando ou dando uma volta colhendo framboesas, e só deixando o serviço de verdade
para os verdadeiramente durões. Temos que envolver todas as nossas habilidades para organizar forças vitais.
Num jardim de permacultura, temos que tratar da questão das formas em que os elementos devem
se posicionar. Alguns desses elementos dizem respeito a fertilização, ou sistemas de troca de energia para
outros elementos. Outros são elementos defensivos que protegem outras plantas em várias formas diferentes.
E alguns servem para proteger outros, pela sombra. Então há forças físicas envolvidas, e há conjuntos de
regras que governam por que certos elementos são colocados juntos. E nós entendemos algumas dessas regras.
Muitas delas são bem óbvias.
Diversidade
Diversidade não se refere tanto ao número de elementos em um sistema, mas sim o número de
conexões funcionais entres esses elementos. Diversidade não é o número de coisas, mas o números de formas
em que as coisas funcionam. Essa é realmente a direção do pensamento da permacultura. Um dia eu estava
sentado, estudando quantas conexões são feitas quando se põem apenas dois elementos juntos, uma estufa de
plantas e um galinheiro. Acho que eu consegui ver uns 129 tipos de conexões benéficas. Então o que estamos
falando não é de uma complicação grandiosa de 3.000 espécies em um sítio.
Seria legal fazermos 3.000 conexões entre 30 espécies ou 30 elementos, com essas conexões
definidas como benéficas ou não benéficas. Você pode ver centenas de exemplos, particularmente em grupos
sociais, onde interesses diversos são não necessariamente benéficos. A diversidade em si não te dá nenhuma
estabilidade ou vantagem.
Então, estamos tentando criar uma associação, como um clube de coisas que trabalham
harmoniosamente juntas. Há regras a seguir ao posicionar os elementos em uma área. Regras pertinentes a
orientação, zoneamenteo, e interações. Há conjuntos de princípios que governam por que nós pomos coisas
juntas, e como as coisas funcionam.
Os departamentos de agricultura definiram terras cultiváveis. O que eles querem dizer é terra que
pode ser arada. Mas eu não vejo nenhum lugar como não cultivável. Há toda uma hierarquia de produtividade
na paisagem, e tudo pode ser usado para produção. Então há realmente duas estratégias para nossa
consideração em agricultura. Uma é descobrir qual é o mínimo ao qual podemos reduzir nossas práticas
agrícolas, e reduzí-las a isso. A outra é encontrar o nível ao qual podemos aumentar o uso de terras
denominadas não cultiváveis para a produção agrícola. Há todo tipo de jogos a se jogar. Estou realmente
surpreso com quão pouco dessas florestas na América é usado para fins produtivos, como floresta.
Princípios
Vejamos agora os princípios que governam esses sistemas. Esses princípios, normas e diretrizes são
baseados no estudo de sistemas naturais. Axiomas são princípios estabelecidos ou verdades auto-evidentes.
Um princípio é uma verdade básica, uma norma de conduta, um modo de se proceder. Uma lei é uma
declaração de um fato, suportada por um conjunto de hipóteses que provaram-se corretas ou viáveis. Teses e
hipóteses são idéias propostas para teste ou discussão. Também há regras e leis por aí que não são na verdade
nem regras nem leis, não fazem nenhum esforço em mostrar como se chegou a elas. Agora, eu desenvolvi um
conjunto de diretrizes que dizem: “esta é uma boa forma a se proceder”. Não têm nada a ver com regras ou
leis, apenas princípios.
Energia, Fonte, e Destino
Lidamos com a Terra, que recebe uma energia razoavelmente constante de outras partes do
universo. Estamos lidando com energia que tem uma fonte renovável, o sol. (Na verdade, o sol está
consumindo-se; porém, ele expandirá e consumirá a Terra, antes de deixar de ser fonte das ondas curtas.
–DH) Entre a fonte e o destino da energia é que vamos intervir. Quanto mais conseguirmos direcionar energia,
entre a fonte e o destino, para reservas úteis, melhor designers seremos. Então o que queremos fazer é
construir um conjunto eficiente de dispositivos de armazenamento úteis para o homem (sic.). Alguns desses
armazenamentos podem ser úteis na criação de outros. O grau de complexidade que conseguiremos, a
quantidade de armazenamento e a eficiência no uso dessa energia, são todos determinados pela nossa
habilidade como designers. Além disso, um monte de energia que não pode ser usada num senso mecânico
pode ser usado num senso biológico. Então, precisamos armazenar energia para fins mecânicos e biológicos.
Energia pode ser transferida de uma forma para outra, mas não pode ser criada ou destruída. Então
nós temos uma escolha no tipo de fluxo que permitiremos através do sistema. Podemos determinar se
armazenaremos a energia, ou a deixaremos sair.
Essa é a escolha que temos com a água, com a chuva. Podemos armazená-la ou deixá-la sair, e
neste caso não a teremos mais disponível. E mesmo que possamos recuperá-la, isso significaria um monte de
esforço para fazê-la disponível de novo. Os engenheiros vão lá em baixo, no vale, porque todo mundo pode
ver que há água lá. Então eles bloqueiam o vale, a água enche o vale e você tem água, um grande lago no
fundo do vale, onde ela é menos útil. Mas essa água veio de cima do morro; se os engenheiros tivessem
armazenado essa água lá em cima, eles poderiam fazer essa água correr por todo tipo de sistemas antes de ela
atingir o vale. Quanto mais próximo à fonte nós fazemos a nossa intervenção, maior o proveito que se pode
obter. Então é lá em cima, próximo à fonte que nós vamos intervir no fluxo. Não é a quantidade de chuva que
conta, mas o número de tarefas que nós induzimos essa água a fazer, isso é o que conta.
Nem toda a energia que entra no sistema é útil. Sempre que mudamos a direção da linha, perdemos
um pouco, não importa o quão bem façamos o projeto, sempre há perdas de energia.
Muito depende na manutenção do ciclo global de elementos biológicos e químicos essenciais,
particularmente carbono, nitrogênio, oxigênio, enxôfre e fósforo. Preocupamo-nos com todos esses ciclos.
A probabilidade de extinção de uma espécie é maior quando a densidade dessa espécie é muito alta
ou muito baixa. Você pode ver como a alta densidade é perigosa para uma espécie por causa da transmissão
muito rápida de pragas e doenças, resultado da exaustão de elementos críticos dos quais essa espécie depende.
É mais difícil de ver como densidades muito baixas são também tão críticas. O fator de número é um fator
ignorado pela maioria das comunidades.
“A probabilidade de extinção de uma espécie é maior
quando a densidade dessa espécie é muito alta ou muito baixa.”
Eu não acho que haja qualquer sociedade cuja continuidade depende de sua própria saúde genética,
que possa existir com uma população abaixo de 300 indivíduos, sem rigoroso controle genético. Em várias
áreas, estamos criando condições que levarão a extinções. Altas densidades populacionais também
freqüentemente começam a incluir uma enorme variedade de desastres genéticos e mutações.
É possível fazer pequenas modificações em um sistema geral para trazer uma maior chance de
sobrevivência dos elementos do sistema, ou um maior rendimento do sistema. Há uma frase terrível que diz:
“Nossa habilidade de mudar a face da Terra aumenta a uma taxa muito maior que nossa habilidade de prever
as conseqüências dessas mudanças.”
E há a tese da ética da vida, que diz que organismos vivos e sistemas vivos não são apenas meios,
mas fins. Além do seu valor para o homem, eles têm um valor intrínseco, o qual nós negamos. Que uma
árvore é algo a ser valorizado pelo que é, mesmo que não tenha nenhum valor prático para nós. Essa noção
parece estranha para muitos de nós. O que está vivo e funcionando, é o que é importante.
Recursos
Recursos são algo que você pode usar em um sistema e aumentar a sua produtividade, ou
rendimento, ou o número de armazenamentos úteis. Mas se você continua além daquele ponto de
produtividade, então o sistema sofre um colapso. E daí vem a noção que qualquer sistema integrado pode
apenas aceitar a quantidade de energia que ele pode produtivamente usar. Isso significa que você pode adubar
em excesso, esquentar em excesso, ou arar em excesso, causando problemas na produtividade. Isso vale para
esterco, e também para dinheiro: há um limite da quantidade que você pode colocar. E o que acontece se você
passa desse limite, é que você passa a ter menos e menos aumento na produtividade, e em seguida um
aumento maior e maior em fatores negativos. Você não pode continuar a meter mais e mais da mesma coisa e
continuar conseguindo um aumento no rendimento.
Um amigo meu foi para Hong Kong. Ele trabalhou no serviço de energia da cidade, com foco no
setor da agricultura. Ele me contou que a agricultura chinesa antiga, com capina manual, produzia, sob
condições muito intensivas, usando adubos naturais, cerca de três vezes mais energia do que consumia. Agora,
eles modernizaram, usando pequenos tratores, fertilizante artificial, etc. Acho que ele disse que estão usando
800% mais energia, com um aumento na produção de 15%. E então, conforme continuaram pondo mais
energia, o rendimento diminuiu. E agora, estão no mesmo esquema que nós: só obtém 4 a 6% daquela energia
de volta.
Portanto, a agricultura passou de um sistema produtor de energia para um sistema consumidor de
energia, da mesma forma que os mares passaram de supridores de oxigênio para consumidores de oxigênio,
tudo porque estamos colocando um excesso de nutrientes. Você pode fazer isso muito rápido em uma lagoa, e
mais lentamente a uma nação ou continente.
Então, há categorias de recursos que são de tipos totalmente diferentes. Há recursos que não são
afetados pelo uso. Você pode olhar para uma vista bonita o dia inteiro, e isso não vai “gastar” a vista.
Informação é outro desses recursos (mas informação é na verdade preservada pelo uso. -DH).
Há outra categoria de coisas que é interessante, pelo fato que elas aumentam conforme o uso.
Quanto mais você usa, mais elas aumentam. Algumas categorias de animais e plantas aumentam umas às
outras por interação, e outras categorias de recursos também fazem isso. E alguns recursos, particularmente
aqueles de renovação rápida, simplesmente diminuem se você não os usa. Gramíneas anuais são um bom
exemplo. Se não usadas, a sua quantidade total no sistema diminui.
Mas a maioria dos recursos cai na categoria de recursos que precisam ser manejados para sua
manutenção. São aqueles que diminuem com o uso. Vamos chamá-los recursos finitos.
Há ainda outra categoria de recurses que, se você usa, diminui todo o resto. Temos um bom
exemplo no urânio e plutônio. Plutônio quando usado tende a gerar resíduos para outros recursos, e alguns
desses usos são horríveis. Coisas como dioxinas, se usadas como recurso, começam a reduzir os recursos em
geral.
Portanto os recursos têm um tipo de uma hierarquia de manejo, e uma hierarquia a respeito de ser
benéfico ou não benéfico. A maioria das coisas que nos fazem felizes ou são manejáveis, ou existem em
abundância. Há também algumas coisas que nós pensamos que precisamos, mas que nos fazem sentir
miseráveis.
Acho que podemos poluir com tempo, e imagino que também com diversidade. Apenas por pôr um
monte de coisas juntas, nós podemos atingir o estágio onde nós poluímos o sistema simplesmente com
diversidade.
Gasolina é um recurso que criou disordem na sociedade moderna. Eu não posso imaginar quando
foi a última vez que alguém usou um galão de gasolina de forma produtiva. Praticamente toda a gasolina que
se gasta é usada para fins improdutivos. Eu usei cerca de meio litro uma vez para destruir um formigueiro,
porque sou alérgico. A meu ver, aquilo foi produtivo. Eu também não sei de nenhum caso na economia de
tratores onde a máquina produza mais energia do que ela usa. Você tem que tirar o óleo do chão, tem que
refinar, transportar. Você me diz que gasolina foi usada pelo avião que me trouxe até aqui. Certo. Mas eu vim
até aqui somente para que vocês não tivessem que ir até lá. É verdade que o petróleo atualmente tem alguns
usos – o que eu chamo de usos restitucionais. Mas, de modo geral, o uso de gasolina tem resultado em
disordem terrível. Isso atinge toda a estrutura social.
Caos é realmente o oposto de harmonia. É competição e indivitualismo conflitantes. Quando tudo
está um caos, se há duas ou três pessoas indo para a mesma direção, você tem que vencer, porque todo o mais
está realmente caindo aos pedaços. Então talvez nós vençamos; talvez estejamos captando uma oportunidade
histórica.
Quando nós fazemos um projeto, eu estou sempre voltando para o ponto do que nós fazemos. Nós
temos um serviço dobrado: recomendar apenas as energias que são produtivas, energias que não são
prejudiciais, e tentar construir harmonia em uma organização funcional, catar os pedaços e fazer uma ordem
harmoniosa.
Não devemos confundir ordem com estética. Tudo “arrumadinho” é algo que só acontece quando
você tem lesão cerebral frontal. Aí você fica bem “organizado”. Esse tipo de organização é sintomático de
lesão cerebral. Criatividade, por outro lado, é sintomática de um cérebro razoavelmente saudável, e é
geralmente uma coisa desordenada. A tolerância à desordem é um dos poucos sinais de saúde na vida. Se
você pode tolerar desordem, você é provavelmente sadio. Criatividade raramente é toda arrumadinha.
“mania de organização é sintomática de lesão cerebral”.
O jardim inglês é um sinal de “organização” extraordinária, e desordem funcional. Você pode
medir muito facilmente, mas não há grande rendimento. O que queremos é uma desordem criativa. Eu repito,
não é o número de elementos em um sistema que é importante, mas o grau de organização funcional desses
elementos – funções benéficas.
Rendimento é a soma de energia útil armazenada. É a soma da energia conservada e gerada em
sistemas. Nunca se trata apenas do rendimento em produção, não o número de quilos de tomates, ou peixe,
etc. – o que é a forma que as pessoas normalmente medem o rendimento – mas a soma de energia em reservas
úteis. Rendimento é uma função de design, e é teoricamente ilimitado. Isto é, eu nunca vi um sistema onde
não se possa, melhorando o design, melhorar o rendimento.
Como o projeto em si é uma função do nosso entendimento do sistema, assim também o
rendimento depende no grau do nosso entendimento das coisas. É o intelecto que decide todas essas coisas, e
não fatores extrínsecos.
Entre a fonte e o destino, a diversidade aumenta: reservas de energia podem aumentar e a
complexidade organizacional pode aumentar. Nosso serviço é converter aquelas pausas no fluxo de algumas
daquelas categorias em recursos benéficos. É o número de nichos em um sistema que vai permitir a
co-sobrevivência de um número de espécies e variedades. É o buraco do pica-pau dentro da floresta.
Agora, de novo, o número de nichos em um sistema depende no design do sistema. Então agora nós
chegamos ao caso ativo. Em situações saturadas com espécies, e com rendimento, podemos fazer uma enorme
diferença se virmos onde podemos criar mais espaço, freqüentemente com movimentos muito pequenos.
(Após encontrarmos os nichos não preenchidos, e preenchê-los. Ecosistemas temperados, em particular, são
freqüentemente incompletos. D.H.). O número de casais de pombos em um rochedo vai depender do número
de beirais disponíveis onde possam fazer ninhos. É fácil aumentar o número desses beirais. Muitas vezes, o
que está emperrando o rendimento não é o fator básico do alimento, mas sim outro fator não relacionado a
comida.
O que devemos fazer é ver como as coisas funcionam, como coisas diferentes funcionam.
Tradições tribais prescrevem que uma pessoa deveria apenas efetuar atos necessários, que
comportamentos desnecessários tendem a ser muito destrutivos. O resto é conseqüência. Portanto, a pessoa
pede desculpas pelo que têm que fazer, e faz. Mas você não vê pessoas fazendo atos desnecessários.
Por volta de 1952, eu tinha uma casa no meio do mato, e inventei, como uma coisa interessante
para fazer, que eu não iria cortar nenhuma árvore, a não ser que eu realmente precisasse. E eu nunca precisei.
Mas nós poderíamos também chegar lá e cortar árvores. Infelizmente, se você tem dinheiro, é difícil se
aguentar. Você acaba sempre fazendo coisas porque você precisa se livrar do dinheiro. Que nem gasolina.
A meu ver, mitologia tribal é uma maneira de ensinar respeito ao ambiente. Eu acredito que
estamos envolvidos em um jogo mais complicado do que inicialmente se havia pensado.
Se você põe peixe e algumas algas numa lagoa, e o peixe acha uma daquelas algas particularmente
gostosa, o peixe come a alga que ele gosta até acabar. Portanto, desfavorece a alga. Então, a outra alga, que o
peixe não come, aumenta, controlando o peixe, matando-o de fome. Peixe come alga, alga destrói peixe.
Nós soltamos gado na paisagem, e a paisagem responde. O gado desfavorece plantas que ele gosta
de comer, portanto favorecendo um sistema de plantas que ele não come. Isso fecha o local para o gado.
Algumas dessas plantas são tóxicas para o gado. E isso é o que a gente observa, a paisagem responde.
Há uma resposta na paisagem contra coisas que a prejudicam. Eu não sei como isso funciona contra
uma daquelas máquinas a carvão que mascam a terra, mas provavelmente tem uma resposta a longo prazo,
que pode ser chuva ácida. Então, não dá pra você empurrar alguma coisa, sem que essa coisa te empurre de
volta. Estamos dentro de toda essa física mecânica, que diz que para cada ação há uma reação igual e em
sentido oposto. Mas os chineses dizem: “não, isso não é verdade”. Se você chuta um sistema vivo, ele chuta
de volta com mais força. Sua reação é freqüentemente injustamente opressiva. É como você chegar e
empurrar alguém porta afora. Essa pessoa entra de volta com um porrete na mão, não apenas empurrando de
volta, mas pronta para te arrebentar.
Agora, há diferentes tipos de atos. Há atos por necessidade e atos danosos. Mas também há atos
benéficos. E isso nos dá uma outra hipótese: que você provavelmente vai receber mais benefícios de volta do
que o planejado. E isso também parece ser verdade. O que provavelmente tem acontecido desde o começo de
um sistema conscientemente projetado é que quando colocamos três elementos em conjunto de tal forma que
eles funcionam harmoniosamente, outros resultados benéficos surgem que nós não esperávamos. Isso é algo
que tem acontecido quase sem exceção.
Há algo que não tem sido ensinado: que uma vez que fazemos algo corretamente, isso vai em frente
e faz um monte de outras coisas por si só. Isso parece estar acontecendo. Então parece que há algo
acontecendo ali, e é muito difícil de analizar. Às vezes, você faz um único movimento, simples e direto, que
você espera que vai ser benéfico. E você descobre, se você parar e observar e deixar aquilo trabalhar sozinho,
que as coisas continuam trabalhando, talvez trazendo outros 10 benefícios que você não esperava. Então, se
você observar atentamente, embora você juntou as coisas por uma única razão, você vê que uma vez que você
fez isso, havia umas 12 ou 15 outras razões para você ter feito aquilo. Acho que todos sabemos de exemplos
disso.
Quando alguém grudou a estufa na frente da casa, em vez de deixá-la lá no sol, ele pode ter feito
isso por uma única razão, para aquecer a casa, talvez ou simplesmente deixar mais fácil cuidar das plantas.
Mas daí, um monte de outras coisas boas vieram disso.
Nós não temos tanta certeza do que estamos fazendo, mas os grupos aborígenes estão por aí,
cuidando do seu país sem fazer cerimônia. Eles são razoavelmente discretos a respeito do que fazem, mas
certamente eles estão fazendo um certo ajuste do campo. Eles têm que fazer uma pequena cerimônia para
manter uma nascente de água fluindo em certa montanha. Nós rimos deles. Nós sabemos que aquelas fontes
vão continuar dando água, com ou sem cerimônia. Mas se nós os privarmos de sua religião, as nascentes vão
secar. Você não fala com idiotas sobre conceitos avançados. De qualquer forma, eles não vão nos dizer muito
a respeito do que eles sabem. Suponho que eles se preocupam com o que nós faríamos com a informação.
Então, aqui temos um modo de pensar que eu acho muito produtivo, porque representa um monte
de coisas. “tudo funciona de duas formas” é um desses pensamentos; “se você faz algo corretamente, isso
que você fez vai fazer um monte de outras coisas corretas por si só” seria outro.
Agora, temos argumentos a respeito de se devemos começar por princípios e avançar para o mundo
real, ou – como eu tento fazer – começar com o mundo real e então chegar aos princípios. Ficamos nós
sentados debaixo de uma árvore, olhando para o que está realmente acontecendo, pensando: “Bem, algo assim
e assim está acontecendo ali”? Ou nós começamos a entrar na natureza e tentamos entender o que acontece lá,
e então vamos para nosso jardim? Nós temos essa questão sobre de qual modo devemos proceder: da filosofia
para o jardim ou do jardim para a filosofia. Acho que há pessoas trabalhando de ambas as formas. pessoas
vindo do abstrato para o jardim e pessoas vindo do jardim e indo para o abstrato. A maioria de nós está vindo
de dentro do jardim e indo em direção à filosofia. Uns poucos já estiveram lá em cima, no templo, e agora
estão descendo para o jardim.
Eu acho, de novo, que em nossa educação geral, e particularmente em nossa educação primária, nos
ensinam um monte de fenômenos estáticos. Mas não nos ensinam processos interativos, e não nos ensinam
nada sobre a ressonância das coisas. O mundo real onde vivemos está em constante fluxo. As coisas estão a
caminho de algum lugar a todo tempo. Não há tal coisa como uma figura estática de um fenômeno natural.
Tudo está a caminho de novas fases. Porém, nós ensinamos as coisas como se fossem verdades rígidas.
Somos culturalmente bloqueados. Isso é porque somos uma cultura científica: tentamos medir tudo. Há
diferentes formas de abordar as coisas. Eu não posso entender símbolos; algumas pessoas não podem
aprender números, outros não entendem dimensões. É por isso que é benéfica a associação em pequenos
grupos, tentar trazer diferentes luzes sobre as mesmas verdades, tentar entender as diferentes sombras e
nuances da realidade. Esta dinâmica está faltando na educação.
Há algo que nós devíamos sentar no chão e discutir bastante. Há essa harmônica que, se
conseguirmos pegar, nos dá bastante entendimento, bastante controle sobre os eventos. Nosso trabalho é pôr
as coisas no devido lugar, e deixá-las “descansar em paz”. Mas para pôr algo no lugar certo, precisa-se de
um monte de informação sobre o assunto. Qualquer coisa que estejamos tentando posicionar, seja uma
construção ou uma árvore ou um animal, ou uma estrada, uma estrutura, uma pessoa, temos que saber essas
coisas sobre isso. Temos que saber suas funções intrínsecas, o que é natural para essa coisa, o que essa coisa
simplesmente não pode deixar de fazer pelo simples fato de ser o que é, sendo vivo. Alguns animais e plantas
devem reproduzir-se em abundância, e podem fazê-lo de diferentes formas. E há coisas que nós podemos
categorizar como rendimento, nas quais podemos estar interessados. Essas coisas podem ser de dois ou três
níveis ou naturezas. Há o que podemos chamar rendimentos diretos. Galinhas põem ovos. Então talvez
tenhamos rendimentos que são derivados, secundários, ou rendimentos processados. O esterco das galinhas
produzirá metano. E nós temos que saber quais são os diferentes rendimentos.
Também vale a pena saber como os elementos funcionam. Eles têm comportamentos, coisas que
eles fazem. Eles andam por aí, ou desviam por aí. Eles têm propriedades. Eles vão ou não refletir luz. Eles
têm propriedades em função do que eles são. Eles têm côr. Eles têm comportamentos. Eles têm todo um
conjunto de interações e comportamentos em resposta a estímulos. Comportamentos podem ser também de
curto prazo ou longo prazo. Muito freqüentemente comentamos sobre o comportamento de curto prazo das
coisas, o que é diferente de como elas comportam-se a longo prazo. Nossa ciência, e particularmente a
psicologia, sofre muito por não olhar para os comportamentos a longo prazo.
Agora se nós soubéssemos o suficiente, se tivéssemos informação suficiente, então muitas dessas
coisas poderiam ser listadas para cada elemento no sistema, cada entidade. E então poderíamos fazer um
tremendo uso disso em design. Mas essas não são coisas que são listadas como conhecimento sobre as
entidades. Você pode obter conhecimento de quase qualquer coisa sobre uma árvore, exceto essas coisas. Que
azar! Muito pouco é sabido sobre as propriedades de uma árvore. Em relação ao rendimento, pode ser quase
imossível de se saber. Uma vez eu tentei descobrir como as pessoas usavam a nogueira. Descobri que há um
povo que baseia toda a sua cultura nas nogueiras; outro povo pode basear a sua cultura no bambu. Ou você
pode apenas considerar as nozes como nozes. Depende de você.
Se você tem uma idéia razoável do que se sabe sobre algo, então você é capaz de posicionar esse
algo de forma que ele possa funcionar, de forma que sua função intrínseca é possível de ocorrer. Então esse
algo produzirá seu rendimento, e seus rendimentos secundários também podem ser aproveitados, e tudo se
comportará de forma favorável porque nós pusemos esse algo perto de coisas que são benéficas a ele.
Então há uma enorme diferença entre o modo que nós fazemos um design em permacultura e o
modo que um agrônomo o faria. Realmente, o que estamos tentando fazer é deixar as coisas funcionarem de
uma forma natural.
Créditos à Bill Morrison e Yankee Permacultura
Para ler na íntegra e outras informações:
http://www.barkingfrogspermaculture.org/
http://www.barkingfrogspermaculture.org/panfleto1.pdf
http://www.barkingfrogspermaculture.org/panfleto2.pdf
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